Conteúdos | Estratégia Empresarial e Jurídica
ITCMD: Por que o valor venal deveria continuar sendo a base de cálculo, mesmo nas holdings familiares
RESUMO
O presente artigo analisa os impactos da decisão proferida pelos Ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que têm decidido que o ITCMD – imposto da doação e da herança – deve incidir sobre o valor de mercado dos imóveis em holdings familiares. Partindo da análise dos fundamentos legais, especialmente o art. 38 do Código Tributário Nacional e o princípio da legalidade previsto no art. 150, I, da Constituição Federal, sustenta-se que a base de cálculo do imposto deve permanecer sendo o valor venal, como forma de garantir segurança jurídica e respeitar a legalidade tributária. A substituição desse critério por meio de interpretação judicial representa risco à previsibilidade do planejamento patrimonial e desestimula a adoção de práticas legítimas por parte dos contribuintes.
Palavras-chave: ITCMD. Valor venal. Valor de mercado. Planejamento patrimonial. Legalidade tributária.
INTRODUÇÃO
A decisão do STJ trouxe grande repercussão no meio jurídico e contábil ao permitir que a base de cálculo do ITCMD seja o valor de mercado dos imóveis, mesmo quando se trata de sua transferência para holdings familiares, via integralização de capital social.
Embora o julgado tenha como pano de fundo o combate à elisão fiscal abusiva, a decisão representa, na prática, um afastamento da legalidade tributária, trazendo sérios reflexos ao planejamento patrimonial legítimo. Este artigo visa expor os fundamentos legais aplicáveis ao tema e defender a manutenção do valor venal como base de cálculo do ITCMD, nos termos do ordenamento jurídico vigente.
VALOR VENAL E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA
O Código Tributário Nacional, em seu art. 38, dispõe de forma objetiva: a base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos.
Além disso, o art. 150, inciso I, da Constituição Federal estabelece o princípio da legalidade tributária, segundo o qual nenhum tributo pode ser instituído ou majorado sem previsão legal.
A alteração do critério de cálculo do ITCMD para o valor de mercado, sem que exista lei específica que o autorize, configura violação direta à legalidade. A interpretação judicial que equipara o valor de mercado à base de cálculo válida carece de respaldo legislativo, sendo, portanto, inconstitucional e insegura.
VALOR VENAL VERSUS VALOR DE MERCADO: ANÁLISE CRÍTICA
A divergência entre os conceitos de valor venal e valor de mercado é sensível e relevante. O valor venal é objetivo, sendo utilizado inclusive em outros tributos, como o ITBI e o IPTU, com base em critérios oficiais e previsíveis. Já o valor de mercado é variável, instável e depende de avaliações subjetivas, frequentemente contestadas tanto por contribuintes quanto por peritos.
Adotar o valor de mercado como base de cálculo do ITCMD — sem regra clara — abre margem para insegurança jurídica, fiscalizações arbitrárias e autuações fundamentadas em presunções, e não em provas.
HOLDINGS FAMILIARES E A PRESUNÇÃO DE SIMULAÇÃO
A decisão do STJ parte da premissa de que a não utilização econômica dos bens pela holding caracteriza simulação, ou seja, fraude tributária. Contudo, tal inferência desconsidera que o uso de holdings familiares para planejamento sucessório, proteção patrimonial e governança empresarial é uma prática legal, legítima e consolidada no Direito brasileiro.
Transformar o uso de uma holding em sinônimo de fraude, apenas por se utilizar o valor venal, representa inversão do ônus da prova e desprestigia o contribuinte que age de forma transparente e dentro da legalidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A defesa do valor venal como base de cálculo do ITCMD não se trata de um privilégio ao contribuinte, mas sim da manutenção da legalidade tributária e da previsibilidade nas relações jurídicas. Mudar esse parâmetro via decisão judicial, sem respaldo normativo, viola o sistema de competências tributárias previsto na Constituição e fragiliza os planejamentos familiares legítimos.
Se o objetivo do Fisco é combater abusos, que o faça com base em provas concretas, e não por meio de presunções generalizadas. Caso o legislador entenda necessária a alteração do critério de base de cálculo, que a promova por meio de lei — como manda a Constituição.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.BRASIL. Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 out. 1966.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). Recurso Especial n.º 199.793/SP.
Relator: Min. Gurgel de Faria. Julgado em 12 mar. 2024. Disponível em: https://cnbsp.org.br/2025/03/21/stj-estabelece-que-o-itcmd-deve-ser-calculado-com- base-no-valor-de-mercado-dos-bens-imoveis-em-holdings-familiares/. Acesso em: 23 mar. 2025.
DIA A DIA TRIBUTÁRIO. STJ valida ITCMD sobre valor de mercado de imóveis em holding.DiaaDiaTributário,18mar.2024.Disponívelem: https://www.diaadiatributario.com.br/stj-valida-itcmd-sobre-valor-de-mercado-de- imoveis-em-holding/. Acesso em: 23 mar. 2025.
Confira outras postagens
Assine nossa newsletter
Cadastre-se para acessar conteúdos essenciais do universo jurídico e tomar decisões estratégicas que impulsionarão o sucesso do seu negócio.
Seus dados estão seguros!